“Digo a verdade em Cristo, não minto, testemunhando comigo, no Espírito Santo, a minha própria consciência”. (Rm 9.1)
A maior glória de Deus é a Sua santidade, em virtude da qual odeia e destrói o mal, ama e opera o bem. Na humanidade, a consciência tem a mesma função: condenar o pecado e aprovar o que é certo e bom. Após a queda no pecado, a consciência foi o que sobrou da imagem de Deus no homem, como aquilo que mais se aproxima de Seu caráter, como a guardiã da honra Dele. A obra redentora de Deus começa na consciência. O Espírito de Deus é o Espírito de santidade; a consciência é uma fagulha da santidade divina. A harmonia entre a obra do Espírito Santo, em renovar e santificar o homem, e a obra da consciência é íntima e essencial. O crente que deseja ser cheio com o Espírito Santo e experimentar fartamente as bênçãos que Ele dá, deve primeiro conceder à sua consciência o lugar de honra que lhe é devido. A fidelidade à consciência é o primeiro passo na senda da restauração à santidade de Deus. Uma boa consciência é o princípio fundamental e característico da verdadeira espiritualidade. À medida que a consciência testifica em imediata resposta a Deus e à medida que o Espírito dá testemunho da aceitação, por parte de Deus, da nossa fé e obediência, então os dois tornam-se um. A consciência e o Espírito são unidos quando aquele constata que o Pai nos respondeu, enquanto este testifica que Deus aceitou nossa fé e obediência.
A consciência pode ser comparada à janela de um quarto pela qual irradia a luz do céu e, bem como, pela qual podemos ver o céu. O coração é o aposento que expressa nossa vida, ego e alma com suas capacidades e afeições. Nas paredes desse aposento, está escrita a lei de Deus. Mesmo nos povos pagãos, ela é ainda parcialmente legível, embora tristemente obscurecida e descaracterizada. No crente, a lei está escrita, pelo Espírito Santo, em letras de luz, as quais são frequentemente turvas no princípio, mas tornam-se mais claras e evidentes à medida que são expostas à luz que vem de Deus. A cada pecado que cometo, a luz que brilha interiormente evidencia-o e condena-o. Se o pecado não é confessado e abandonado, a mancha permanece e a consciência torna-se corrompida porque a mente rejeitou o ensino da luz (Tt 1.15). E assim, com pecado sobre pecado, a janela fica mais e mais opaca, até que a luz mal consegue brilhar através dela, ao ponto de um cristão poder passar a pecar sem perturbação, pois sua consciência tornou-se praticamente cega e insensível.
Em Seu trabalho de renovação, o Espírito Santo não cria novas faculdades; Ele renova e santifica aquelas que já existem. A consciência é uma obra do Espírito de Deus na função de Criador. Como Espírito de Deus, na função de Redentor, Seu primeiro cuidado é restaurar o que o pecado corrompeu. É somente restaurando a consciência à sua função plena e saudável, e nela revelando a graça maravilhosa de Cristo, com “o Espírito testificando com o nosso espírito”, que Ele habilita o crente a viver uma vida na plena luz do favor de Deus. É quando a janela do coração, que tem vista para o céu, é limpa, e assim permanece, é que podemos andar na luz.
Por meio da consciência, o Espírito faz com que a luz da lei santa de Deus brilhe dentro do coração. Um quarto pode ter as cortinas puxadas, ou mesmo as venezianas fechadas, mas isso não impede que a luz de um relâmpago, de tempo em tempo, brilhe através delas. É possível que uma consciência esteja tão corrompida e cauterizada a ponto da pessoa continuar vivendo como se tudo estivesse “normal”. Quando o relâmpago do Sinai brilha no coração, a consciência desperta e fica pronta para admitir e sofrer a condenação. Tanto a lei quanto o evangelho, com o seu chamado ao arrependimento e a sua convicção de pecado, apelam para a consciência. É apenas quando a consciência concorda com a acusação da transgressão e da incredulidade, que o livramento pode verdadeiramente vir.
É através da consciência que o Espírito, do mesmo modo, faz com que a luz da misericórdia brilhe. Quando as janelas de uma casa estão manchadas, ainda podem ser lavadas. “… muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, a si mesmo se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas para servirmos ao Deus vivo!” (Hb 9:14; 10:2, 22). O alvo do sangue de Cristo é alcançar a consciência, para silenciar suas acusações, e limpá-la até que possa testificar: cada mácula está removida; o amor do Pai faz com que Cristo, em brilho evidente, irradie em minha alma. Este é o privilégio de cada crente. Isso é o que se verifica quando a consciência diz: “amém” à mensagem de Deus a respeito do poder do sangue de Jesus.
A consciência que foi purificada no sangue deve ser mantida limpa através de um andar em obediência e fé, com a luz do cuidado de Deus brilhando sobre ela. Diante da promessa de que o Espírito de habitação, o Espírito de Cristo, se responsabilizaria em guiar-nos em toda a vontade de Deus, é a consciência que constata e testifica que Ele tem realizado esta obra. O crente é chamado a andar em humildade e vigilância, a fim de que em nada sua consciência o acuse de não ter feito o que ele sabia ser certo ou ter feito o que não provém de fé. Ele deve estar contente com nada menos do que o testemunho da boa consciência, conforme ressaltou Paulo: “Porque a nossa glória é esta: o testemunho da nossa consciência, de que, com santidade e sinceridade de Deus, não com sabedoria humana, mas, na graça divina, temos vivido no mundo…” (2 Co 1.12. Cf. At 23.1; 24.16; 2 Tm 1.3). Note bem estas palavras: “nossa glória é esta: o testemunho da nossa consciência”. É quando a janela é mantida limpa e brilhante por nossa habitação na luz que nós podemos ter comunhão com o Pai e com o Filho. O amor do céu resplandece fulgurante em nosso interior, e nosso amor responde em confiança infantil. “Amados, se o coração não nos acusar, temos confiança diante de Deus… porque guardamos os seus mandamentos e fazemos diante dele o que lhe é agradável” (1 Jo 3.21-22).
A manutenção de uma boa consciência em relação a Deus é essencial para a vida da fé. O crente não deve se contentar com nada menos que isso. Ele deve estar convicto de que isso está ao seu alcance. Os crentes do Antigo Testamento tiveram, pela fé, o testemunho de terem agradado a Deus (Hb 11:4-6, 39). No Novo Testamento, ela se coloca diante de nós não somente como um mandamento a ser obedecido, mas também como uma graça concedida pelo próprio Deus. “… a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda a boa obra e crescendo no conhecimento de Deus; sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória…”; “… para que o nosso Deus vos torne dignos da sua vocação e cumpra com poder todo propósito de bondade e obra de fé…; “… operando em vós o que é agradável diante dele” (Cl 1.10-11; 2 Ts 1.11; Hb 13.21). Quanto mais buscamos esse testemunho da consciência – de que estamos fazendo o que é agradável a Deus – mais sentiremos o livramento daquelas falhas que nos privam de olharmos imediatamente para o sangue de Cristo. O sangue, que limpa a consciência, age no poder da vida eterna, constante, imutável e que salva completamente. ”Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado” (1 Jo 1.7).
A causa da fraqueza da nossa fé é a falta de uma consciência limpa. Perceba como Paulo conecta as duas coisas em 1 Timóteo: “… ao amor que procede de coração puro, e de consciência boa, e de fé sem hipocrisia” (1.5); “… mantendo fé e boa consciência, porquanto alguns, tendo rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé” (1.19). E especialmente 3.9: “… conservando o mistério da fé com a consciência limpa”. A consciência é o fundamento da fé. Aquele que deseja se fortalecer na fé, e ter confiança para com Deus, deve saber se O está agradando (1 Jo 3.21-22). Jesus disse claramente que é para os que O amam e guardam Seus mandamentos que a promessa do Espírito é dirigida. Como podemos reivindicar, confiadamente, essa promessa, a não ser que, em simplicidade infantil, nossa consciência possa testificar que preenchemos as condições? Até que a Igreja possa subir à altura de seu santo chamado como intercessora, e reivindicar essas promessas ilimitadas que lhe estão disponíveis, os crentes se aproximarão de seu Pai, regozijando-se, como Paulo, no testemunho de sua consciência – de que pela graça de Deus estão andando em santidade e sinceridade divina. Devemos compreender que esta conduta exige a mais profunda humildade e traz a maior glória para a graça ofertada por Deus; levando-nos a desistir das nossas pretensões de que podemos alcançar, por nós mesmos, o padrão que Ele se propõe em conceder-nos gratuitamente.
Como pode ser alcançada essa vida santa que nos habilita a invocar diariamente a Deus e aos homens como Paulo: “Digo a verdade em Cristo, não minto, testemunhando comigo, no Espírito Santo, a minha própria consciência”? O primeiro passo é humilhar-se sob a reprovação da consciência. Não se contente com uma confissão superficial de que algo está errado. Tome cuidado com a confusão entre transgressão real e tentação para pecar. Se temos de morrer para o pecado, pelo Espírito de habitação, devemos primeiro lidar com a prática do pecado. Em silenciosa submissão e humilhação, conceda à consciência tempo para reprovar e condenar qualquer pecado. Diga para o seu Pai que você, pela Sua graça, irá obedecer – mesmo nas menores coisas. Aceite, mais uma vez, a oferta de Cristo de governar totalmente seu coração, habitar em você como Senhor e dono. Confie que Ele, pelo Seu Espírito Santo, fará isso, mesmo quando você sentir-se fraco e desamparado. Lembre-se que a obediência, o acolhimento e a observância das palavras de Cristo em sua vontade e vida, é o único caminho para provar a realidade de sua rendição a Ele e o seu interesse em Sua obra e graça. Prometa, em fé, que pela graça de Deus você irá procurar sempre ter uma consciência livre de ofensa a Deus e aos outros.
Quando você seguir esses passos, estará sendo fiel em manter sua consciência pura, e a luz do céu irá resplandecer de forma mais gloriosa no seu coração, revelando o pecado e enfatizando a lei escrita pelo Espírito. Esteja disposto a ser ensinado; confie que o Espírito irá ensiná-lo. Cada esforço sincero para manter limpa a consciência, que foi lavada pelo sangue, será acompanhado da ajuda do Espírito. Renda-se de todo o coração à vontade de Deus e ao poder do Seu Espírito Santo.
À medida que você curvar-se à reprovação da sua consciência e entregar-se completamente para fazer a vontade de Deus, sua intrepidez se fortalecerá, tornando possível ter uma consciência livre de ofensa. O testemunho da consciência sobre o que você está fazendo e irá fazer, pela graça, será acompanhado pelo testemunho do Espírito sobre o que Cristo está fazendo e irá fazer. Em simplicidade infantil, você irá procurar começar cada dia com a simples oração: “Pai, não há nada agora entre o Senhor e este seu filho. Minha consciência, divinamente limpa no sangue, dá testemunho disso. Não permita que nem mesmo a sombra de uma nuvem interfira nesse dia. Em tudo quero fazer a Sua vontade: Seu Espírito habita em mim, me guia e me fortalece em Cristo”. Você entrará naquela vida que se regozija somente na graça ilimitada, e que diz ao fim de cada dia: nosso gozo é esse: o testemunho de nossa consciência de que em santidade e divina sinceridade, pela graça de Deus, nos conduzimos neste mundo.
(Artigo extraído do capítulo 21 da obra “O Espírito de Cristo”, Editora dos Clássicos, 2013, considerado por muitos como o maior clássico de Andrew Murray e um dos maiores da literatura cristã).
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